sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Assédio na rua.


Vou falar sobre o grande tabu da “mexida na rua”. Todo mundo te dá razão quando um cara passa a mão em você, isso está errado. Mas quando vem nesse tema, as opiniões se dividem. Qual é o mal de um inocente - “Oi, gata” - na rua?
Temos que ver em um contexto maior, não como algo isolado. Toda mulher ouve gracinha na rua, isso é fato. Pode ser das mais leves, como um “Linda” e ir a um “Bocetão”. “ O quê, te chamam de bocetão? Que feio!!! Esse cara é um escroto, (mas é a minoria, pensamos no nosso íntimo). E apesar de ter ouvido bocetão na minha vida, o que mais ouço: “gata”, “linda”, “delícia”. Poxa, mas isso é elogio! O ponto é que depois de ouvir todos os dias, “princesa” ,“gostosa”, “gata” e ”bocetão” acabam soando a mesma coisa. Uma invasão ao meu espaço, um desrespeito. 
Agora, vamos repassar tudo que essa mulher já passou. Quando apareceu o peitinho, já virou alvo de ataque sexual. Eu descobri isso da pior maneira possível. Quando voltava da escola, um cara começou a tocar a minha perna e vi que ele se masturbava pelo bolso da calça de moletom, foi um soco no estomago. 
Enfim, já levei muita passada de mão na bunda, já me encoxaram várias vezes no metro, já tentaram me agarrar e beijar, etc. O toque não acontece todos os dias, mas quando acontece, dói, marca e humilha. E eu já reagi, gritei, empurrei - e o que descobri com todas essas minhas reações? Alguns queriam me bater, outros fugiam, mas no final o desgaste emocional não valia a pena. 
Então, porque ligarei para as gracinhas do dia a dia? Vou brigar com cada um que mexe na rua? Loucura, né? Vou andar rápido, fechar a cara, nem olhar para os lados. Porque não quero que pensem que estou dando “trela”. 
Agora, estou mochilando há 10 meses (nesse momento escrevo de um hostel no Peru) na América do sul. E passei em muitos lugares que ninguém mexia comigo na rua. Em pequenos vilarejos na Bolívia, quando me falavam bom dia, estava tão condicionada a viver com o medo de dar “trela”, que não respondia. Até perceber que era normal, comecei a responder os cumprimentos e PASMEM, eu que dava o bom dia. Para homens, mulheres, velhos, crianças, é uma sensação de liberdade tão boa não ter medo de segundas intenções. Andar pela ruas sem ninguém mexer, te cria uma situação de segurança, de paz. Nesses lugares eu não tinha o medo de ser estuprada, porque não tinha ninguém me lembrando a CADA momento que tem DESEJO SEXUAL por mim. 
É um tipo de prisão, mas estamos tão acostumadas que não percebemos. Eu fiz essa tirinha depois de estar muito tempo sem ser assediada. E foi assustador, todo mundo gritando comigo na rua, voltei com uma sensação, de … Cara, por quê? Eu não mereço isso. Esse assédio cria insegurança, indignação, raiva, humilhação. Nos sentimos um objeto sexual, não uma pessoa.
Como mudar ? Não sei, mas precisamos falar como incomoda as mulheres. Muitos caras não fazem, mas acham aceitável acontecer. É normal, acontece todos os dias, é “cultural”. E pessoalmente não entendo porque os homens fazem isso, deve ser para “auto afirmação” ou “tirar onda”, porque nunca vi uma mulher parar na rua e falar “Olha, estranho, você me chamou de gostosa, aqui está o meu número de celular para a gente marcar de sair depois.” Mas mulher apertando o passo e fechando a cara, eu vejo todos os dias. 
Nem todas as mulheres foram estupradas ou apanharam. Mas todas são assediadas na rua, por isso tantas se identificaram com a HQ. E nem sempre precisa ter toque para nos sentirmos violentadas. 

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